A publicidade moderna exige que as marcas estabeleçam uma conexão autêntica com as novas gerações. Para isso, é necessário entender as necessidades, desejos, crenças e valores desses públicos. Além disso, é preciso estar atento às tendências culturais e às mudanças sociais para criar campanhas relevantes e significativas. Para se conectar de forma autêntica com seu público, as marcas também precisam ser transparentes e honestas. Como resultado, as marcas estão repensando suas estratégias de marketing, desafiando a publicidade tradicional e buscando novas formas de se conectar com seu público.
Na Featured Story deste mês, conversamos com o empresário Ian Black, fundador da New Vegas, uma agência de comunicação full-service focada em pessoas. Ian é um visionário que tem sido pioneiro na criação de soluções criativas que estabelecem ou reforçam interações entre pessoas e empresas. Hoje, vamos discutir como as marcas podem se conectar autenticamente às novas gerações através de tendências e cultura.
Confira a entrevista!
Obrigado por conversar conosco, Ian. Para começar nossa conversa, o que o motivou a fundar a New Vegas?
A minha visão de mundo sempre foi inadequada à cultura publicitária clássica. A vontade de fazer algo que eu realmente acreditava e com as pessoas que eu admirava foram os principais fatores que levaram a fundação da agência. E aqui não me refiro apenas ao jeito de trabalhar, os processos e os trabalhos em si, mas sobre uma ética de como atuar no mundo a partir desse empreendimento.
A forma como as pessoas viam, percebiam e atuavam no mundo publicitário clássico nunca foi algo que me inspirou. Pelo contrário.
Eu não sou publicitário de formação. Comecei a trabalhar no mercado em 2007, numa agência de marketing viral que nem existe mais. Em 2018 eu trabalhei numa agência boutique focada em criatividade no-media. Em 2019 eu tive minha primeira e única experiência em uma agência com estrutura e pensamento clássico, a Wunderman, e entendi que definitivamente eu não me alinhava naquele universo. Pedi demissão e nunca mais voltei.
Quais são as principais tendências que você observa nas novas gerações em relação à cultura, questões sociais e políticas?
As pessoas estão muito mais conscientes e ativas politicamente. E por política eu sempre reitero que não podemos cometer o erro mirim de interpretá-la pela lente política partidária, mas política como possibilidade de vida. Há uma organização extraordinária de movimentos sociais, mais ou menos articulados e institucionalizados, que trazem para o debate público perspectivas distintas a partir dessas vivências marginalizadas. E essas perspectivas vem embaladas na cultura: música, moda, comportamento, literatura, audiovisual… O que une todos esses movimentos e tendências é a inevitabilidade da colaboração, do viver coletivo como articulador de um saber comum e de benefício mútuo, em oposição ao esgotamento da glamourização do sucesso individual que ainda domina a nossa cultura mainstream (onde a publicidade clássica ainda vive).
Como você acredita que as marcas podem se conectar autenticamente às novas gerações através dessas tendências?
A publicidade clássica, por questões de classe, gênero e raça, sempre se manteve confortavelmente apartada da vida política do Brasil. E as próprias empresas, que bancam as agências, desenvolveram seus negócios a partir de uma lógica de consumo individual e individualista, destituído do ser político. Não à toa, ainda chamamos pessoas, em toda a sua complexidade, por consumidores ou target.
E não me refiro a política partidária, mas da política como modo de vida das pessoas. A publicidade enxerga movimentos culturais como tendência reducionista e não como manifestações relativas a um contexto inevitavelmente complexo.
Um outro problema é o demográfico dos dois principais simbolos institucionais do nosso mercado: agências e departamentos de marketing. Embora o Brasil seja um país com uma diversidade de culturas invejável, mas os departamentos de marketing e as agências são o extremo oposto dessa característica. As mesmas pessoas que pertencem a mesma classe social, que estudaram em escolas particulares e nas mesmas 4 faculdades de elite (ECA, ESPM, PUC, FAAP), que foram indicadas nas agências ou entraram naqueles programas de trainee que hoje percebemos como “cota racial de gente branca”, que viajaram mais para fora do para dentro do país e que consomem pesquisas e estudos vindos de fora ou com metodologia desenvolvida pelas pessoas desses mesmos grupos.
O resultado foi uma homogeneização do público, modelo que não encontrou muita resistência enquanto a TV e os meios unidirecionais analógicos se mantiveram hegemônicos.
O problema é que nem as agências ou os departamentos de marketing promoveram reformas em suas estruturas a ponto de conseguir trazer pessoas com novas perspectivas e menos ainda com novas formas de se comunicar. O mercado publicitário também é muito fechado e não incentiva o surgimento de novas agências de propriedade de pessoas com perspectivas não brancas-e-masculinas. Pelo contrário.
A própria ideia de áreas de diversidade, dentro de agências ou marcas, mostra muito mais como ainda se enxerga novas perspectivas e ações como coisas separadas do negócio, quando elas deveriam acontecer num processo de integração ou de abertura. Por isso que renego o termo “inclusão”, porque ele orienta a uma inclusão dessas novas pessoas dentro de um pensamento antiquado e ineficaz, e não uma abertura para o novo.
Então o desafio está na urgência de reformas em áreas de marketing e clientes para que haja uma abertura real para novas formas de ver, entender e se relacionar com as pessoas, para além do consumo. E isso também demanda um dinheiro e uma abertura de poder que não me parece estar nos planos de ninguém.
Você já trabalhou com marcas que repensaram suas estratégias de marketing para se adaptar às novas gerações? Compartilhe suas principais lições.
Diferente do que imaginamos (e gostaríamos) as mudanças não acontecem de uma hora para outra. As mudanças não acontecem num estalo e voilá, vamos mudar a nossa estratégia de comunicação. Muito disso acontece pq temos o hábito de pensar em marcas como entidades de pessoa física, onde não é raro ouvirmos ou lermos a frase que começa com “As marcas precisam aprender que…”. Uma marca não aprende nada, marca não é instituída de uma consciência ou estrutura cognitiva que possibilite-a a aprender ou desaprender algo. Essa responsabilidade, feliz ou infelizmente, ainda está sob a responsabilidade dos seres humanos. E no caso das marcas, muitos seres humanos ao mesmo tempo, com várias áreas e níveis operacionais e estratégicos de decisão, com o compromisso de manter empregos e gerar resultados para investidores. Talvez a forma mais adequada para grandes empresas seja aquela das criaturas árvore do Senhor dos Anéis.
Dessa forma, é importante entender que o trabalho de mudança de uma empresa não acontece com um estalo ou uma provocação, nem mesmo com um processo. Como agência, devemos adotar uma postura de sempre atuarmos de acordo com o nosso nome, sendo agenciadores da relação com as pessoas, propondo reflexões e sugerindo ações que, testadas e provadas, vão sendo implementadas ao todo. E da parte das empresas, ampliar o entendimento da relação comercial com a agência, garantindo investimentos não apenas para resultados imediatos de comunicação, mas como foco na qualificação da inteligência.
Para finalizar nossa entrevista, como a New Vegas usa sua expertise em comunicação para ajudar as marcas a estabelecer ou reforçar interações com as novas gerações?
Propondo duas mudanças na abordagem da comunicação. As duas atuam como ações que vão além dos procedimentos tradicionais. A primeira acontece no planejamento, trazendo uma abordagem que englobe o entendimento do cliente dentro de um contexto muito mais amplo, tratando como sujeito coletivo do mundo e entendendo o quanto os fatores geopolíticos vão orientando a comportamentos e possibilidades de estar no mundo. A outra está na conexão de execução com inteligência a partir das relações, garantindo que tão ou mais importante do que as minhas peças publicitárias são as conversas que surgem a partir das mesmas.