Será que a IA vai simplesmente reproduzir os preconceitos que já acontecem no mercado de influência e nas redes sociais ou pode ajudar em novos caminhos?
O recente relatório “The Future of Jobs” do Fórum Econômico Mundial projeta que, até 2027, aproximadamente sete em cada 10 empresas irão incorporar IA (Inteligência Artificial) em suas operações.
Este impulso tecnológico também se reflete nas previsões de crescimento para empregos, com cargos como analistas e cientistas de dados, especialistas em big data, especialistas em aprendizado de máquina de inteligência artificial e profissionais de segurança cibernética esperando um aumento médio de 30% nesse período. Tudo mostra que é um avanço inevitável.
Neste cenário de rápida evolução, a presença da IA no marketing redefine a forma como consumimos informações. Observamos, cotidianamente, algoritmos que antecipam nossos desejos antes mesmo de expressá-los publicamente. Como essa revolução impactará o mercado de influência digital? Quais são as expectativas?
Segundo a Harvard Business Review, a IA tem o potencial de aprimorar significativamente funções-chave de marketing, desde a compreensão das preferências do consumidor até a conexão com produtos e serviços mais direcionados, promovendo uma compra mais efetiva. Grandes empresas já investem na coleta e interpretação de dados com o auxílio da IA, gerando produtos capazes de oferecer inteligência para interações com consumidores, seja ela digital ou tradicional.
Aitana López, uma figura singular no marketing de influência, personifica essa tendência. Criada por IA, Aitana conquistou mais de 263 mil seguidores no Instagram, colaborando com marcas de beleza e suplementos. Esse experimento de uma agência espanhola não apenas destaca sua presença digital cativante, mas também revela o potencial inexplorado da IA nesse setor.
A criação de Aitana López surgiu a partir de desafios enfrentados por seu criador ao lidar com modelos e influenciadores reais, refletindo a inovação crescente da IA no marketing de influência. O serviço de influencers por IA, anunciado como uma inovação no site da empresa, cobra remunerações mensais de até 10 mil euros e oferece a capacidade de colaborar com qualquer projeto ou empresa.
A conta de Aitana López, apesar de ser fundamentada em uma entidade não humana, conquistou um número impressionante de seguidores, evidenciando a influência que personalidades geradas por IA podem exercer sobre as audiências digitais. Seu rendimento mensal mostra o poder de atração e o potencial econômico desses novos protagonistas digitais.
A ascensão dos influenciadores digitais gerados por IA sinaliza uma nova era, desafiando noções convencionais de autenticidade e conexão emocional. Enquanto os influenciadores humanos são valorizados por experiências de vida, emoções e opiniões, Aitana López ilustra como a IA pode criar uma presença digital relevante , com um custo controlado e adaptável, introduzindo uma nova dinâmica no universo do marketing de influência.
No entanto, os influenciadores gerados por IA levantam questionamentos éticos importantes sobre a interação com entidades não humanas e o impacto na autenticidade percebida. De quem é a responsabilidade pelos conteúdos gerados? E como evitar a disseminação de informações falsas também são cruciais para garantir uma utilização responsável da IA no marketing de influência?
Além disso, os perfis criados por IA ascendem algumas luzes vermelhas. Uma das mais importantes é a replicação de algoritmos cheios de preconceitos e que vão no caminho contrário da busca por diversidade e representatividade nas redes sociais. Não por acaso, a maioria destes perfis são mulheres brancas, jovens e magras. Será que a IA vai simplesmente reproduzir os preconceitos que já acontecem no mercado de influência e nas redes sociais ou pode ajudar em novos caminhos?
Quando estive a frente de um time enorme de influenciadoras de uma marca de beleza, era fácil observar como esse perfil de beleza “padrão” conseguia um número de contratos, seguidores e visibilidade muito maior do que de outros perfis que representavam grupos minorizados.
Nesse sentido, empresas que fazem o levantamento e curadoria de influenciadores podem ajudar as marcas a fugir de potenciais riscos que o mercado de influência pode correr, analisando a relevância, conteúdo e comportamento dos perfis de influenciadores, inclusive os gerados por IA.
Outra consideração importante reside no processamento de dados pela IA. O uso de dados sensíveis e a possibilidade de respostas não alinhadas com a realidade demandam cautela e verificação rigorosa por parte dos profissionais de marketing. A dúvida persiste: estamos preparados para questionar as respostas da IA e perceber possíveis falhas antes que seja tarde?
Fernando Osório, professor do ICMC (Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação) da USP, destaca que toda tecnologia, quanto mais avançada, impacta a sociedade. “Como em qualquer avanço tecnológico, há riscos se mal utilizada, e a IA não é exceção”, afirma Osório.
Ao adentrar o reino da IA, a “espontaneidade” característica dos influenciadores humanos toma uma forma diferente, baseada em programação e algoritmos desenvolvidos por seus criadores (sim, por trás dos perfis de IA também existem criadores). A transparência surge como princípio não negociável. Consumidores precisam estar cientes de que interagem com um influenciador baseado em IA, não uma personalidade humana. A confiança é construída através da clareza sobre a origem dessas interações digitais.
Em última análise, Aitana López e seus pares gerados por IA representam uma evolução intrigante no marketing de influência. Conforme nos adaptamos a essa nova era, é crucial refletir sobre como essas entidades não humanas moldarão a paisagem digital e também a natureza da influência e autenticidade no século XXI.
Escrito por Alexandre Manisck, líder de operações na Social Talent, que faz parte do grupo BPool.